The Project Gutenberg EBook of Romanceiro III, by V. de Almeida Garrett This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this eBook or online at www.gutenberg.org/license Title: Romanceiro III Romances Cavalherescos Antigos Author: V. de Almeida Garrett Release Date: October 12, 2020 [EBook #63439] Language: Portuguese Character set encoding: UTF-8 *** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK ROMANCEIRO III *** Produced by Pedro Saborano and the Online Distributed Proofreading Team at https://www.pgdp.net (This book was produced from scanned images of public domain material from the Google Books project.)
OBRAS
DO
V. DE ALMEIDA GARRETT
XV
(TERCEIRO DO ROMANCEIRO)
ROMANCEIRO
PELO
V. DE ALMEIDA GARRETT
III
ROMANCES CAVALHERESCOS ANTIGOS
TERCEIRA EDIÇÃO
LISBOA
IMPRENSA NACIONAL
1875
Por não fazer demaziado volume, dividiu-se o segundo livro d’esta collecção em duas partes, cada uma das quaes forma um tomo separado.
N’este segundo vão tambem em appendice as traducções inglezas de Sir John Adamson de alguns dos romances do primeiro livro.
O tomo quarto está destinado a conter o terceiro livro, que é o das lendas e prophecias. Se porêm apparecerem no intervallo alguns romances ainda não descubertos que pertençam á classe do segundo livro, accrescentar-se-ha uma terceira parte; e com ella começará, n’esse caso, o seguinte quarto volume.
Lisboa, agosto 9, 1851.
Aqui vai outra romeira, e não sei se de Sanctiago tambem; mas creio que não, porque o diria algures o texto do romance: não é orago que deixasse de se nomear.
É lindo, singelo, perfeito exemplar no seu genero. Não me consta que ande por mais terras nossas do que pelas do Minho e Tras-os-montes. So pelas duas versões d’estas provincias o tive de appurar; e sem muito custo, porque é simples de si, e pouco o alteraram na tradição. Tem todo o sabor e ingenuidade antiga, conserva perfeitamente os costumes crus da edade barbara a que se refere. Tambem não occorre nos romanceiros dos nossos vizinhos, e estou seguro que é ésta a primeira vez que se vê escripto e impresso.
As variantes que valem alguma coisa vão notadas á margem, e não são muitas.
So se incontrou este bello romancinho do ‘Conde Nillo’ na provincia de Tras-os-montes e nas ilhas dos Açores. Nas collecções castelhanas é ommisso. Não sei porquê, mas sinto[17] que tem o ar francez ou proençal. Ou talvez normando? Da nossa Hespanha é que elle me não parece oriundo. Tudo isto porêm é sentir; julgar não, que não tenho por onde.
Nillo não é nome portuguez, nem sei que fôsse castelhano, leonez ou de Aragão. De donde será? Ou é corrupção, como tantas, de outro nome? Mas de que nome? Series e series de dúvidas e perguntas ás quaes confesso a minha completa inhabilidade de responder.
Seja como for, o romance é bonito, elegante e gracioso, tem todo o cunho antigo verdadeiro, e não parece dos que mais padeceram na sua transmissão até nós.
Ésta pequena xácara, curta, simples e que mais parece alludir a uma anecdota sabida, do que recontá-la, não a incontrei senão na[25] provincia de Tras-os-montes. Tres differentes, mas pouco differentes, versões d’alli me vieram; e, approveitando de todas, se restituiu o texto como aqui vai. Tem não sei que resaibo á sarcastica ‘sirvente’ do trovador. É mordaz, epigrammatica; e até se permitte fazer o seu calimburgo, quando a donzella requestada responde ao seductor:
Onde a graça do equívoco está em que o verbo ‘contar’ tanto significa fazer ‘contas’ como ‘referir o que se passou.’
Não ha variantes que mereçam a pena de se conservar, nem licção castelhana que se ache nos romanceiros.
Não é dos que mais se cantam, nem tem a popularidade de outros muitos, o romance da ‘Peregrina’ que alguns tambem chamam da[33] ‘Princeza’.—A licção que principalmente segui veio-me do Porto, e é a mais completa. Das outras provincias só obtive fragmentos muito interpolados. Comtudo approveitei bastante d’elles para restituir o texto e dar nexo e clareza á narrativa. O que se não utilisou para este fim, vai nas variantes.
O final, sublime e poetica idea que tanta predilecção mereceu aos antigos menestreis, é o mesmo de outros romances. Ja notei[14] que francezes e inglezes o usaram em suas composições. Entre nós apparece repetido muitas[34] vezes. Fez-se um ‘logar commum’ romantico assim como tantas coisas bellas dos poetas gregos e latinos se fizeram, por sua popularidade, logares communs classicos. Que Homero ou que Virgilio da meia-edade foi o original inventor d’este? Não é possivel sabê-lo. E sabemos nós se eguaes bellezas da Iliada ou da Eneada são ou não repettições, reminiscencias de outros poetas mais antigos cujas obras ou cujos nomes não chegaram até nós?
A ‘Peregrina’ tem todos os characteres de antiga e original. É bella e simples e verdadeira. Nos romanceiros castelhanos não vem; nem se incontra nada parecido com a singella historia que ingenuamente narra. Mas d’estas historias houve tantas n’aquelles ditosos tempos da andante cavallaria! Mal haja o damninho talento de Cervantes que as fez acabar n’um Dom Quixote e na sua Dulcinea!
O assumpto d’este romance é um casamento á hora da morte, uma d’aquellas tardias mas solemnes reparações que a religião, a honra, o amor tantas vezes têem arrancado á consciencia do moribundo.
Os preconceitos de nascimento luctam, poderosos ainda n’esse momento extremo, com os deveres da religião, com os sentimentos d’alma, com os mesmos dictames da verdadeira honra. Oiro é a primeira coisa que o fidalgo expirante se lembra de deixar á infeliz donzella,—infelix virgo!—em compensação da sua honra perdida. ‘Mil cruzados’ lhe deixa: falta ahi villão que a queira, burguez que a requeste e cubra de seu nome vulgar a doirada fragilidade de uma menina tam bem dotada por seu senhor e seductor?
‘Mil cruzados não é nada’: lhe objectam.—‘Pois darei mais duzentos’: regateia a suberba agonizante.—‘A honra não se paga aos cruzados.’—‘Pois, terras, villas, senhorios e castellos a quem casar com ella. Ha tanto escudeiro e cavalleiro pobre! Casar com a manceba de seu senhor, e senhor tam generoso, quem hade recusá-lo? E para o que duvidasse... argumento de rei velho e de republicano novo: Tenha a cabeça cortada!’
Forte é o orgulho que assim lucta, quando ja na beira do sepulchro. Tenaz o preconceito que ainda agora fez mentir villanmente o cavalleiro pundonoroso, quando, n’uma derradeira esperança de vida, falsamente promettia á inganada donzella ‘as bençãos de um arcebispo e a estolla da sancta egreja’. Vivesse elle, e taes promessas se cumpririam tanto como as primeiras que a seduziram. Porêm mais forte é a piedade, a honra verdadeira de quem, até o último, combate esse vão orgulho, esse falso pundonor. Era sua mãe; não a mãe da desgraçada, que o não ousaria se viva era—que por ventura foi morrer de vergonha[43] a um canto.—Não, mas sua propria mãe d’elle, do moribundo. Verdadeira mulher de alma e de coração, tudo o mais lhe esquece e despreza, e não vê na infeliz, que alli está debulhada em lagrymas junto ao leito da agonia, senão uma mulher; uma mulher que é victima de seu amor, que tudo quanto era deu a quem tudo lhe quer pagar com tam pouco.
A mulher triumphou. As últimas palavras do vencido são bellas:
Estes grandes quadros desenhados em poucos traços, vivos só de verdade e natureza, são—não me canço de o fazer notar—os que dão á poesia do romance este vigor que se não acha n’outras, este character que a distingue em todas as nações, em todas as linguas.
Mais adeantada civilização trará poetas que inluminem, que repintem a côres estes simples desenhos a lapis do menestrel. Mas crear[44] não hãode elles nunca, se não fecharem os livros escriptos, para abrirem o do coração, para estudar por elle o homem, a natureza que o cria, e o Deus que o fez.
O presente romance veio-me do Minho; variantes notaveis não me appareceram; nas collecções castelhanas não está; e não o creio—isto é, não o presinto mais antigo do que o seculo XV ou principios do XVI.
Se a Dona Izabel da xácara antecedente achou na mãe do seu amante todas as divinas compaixões de um coração feminino, Helena, a boa Helena d’este romance, não incontrou na mãe de seu marido senão a proverbial ‘sogra’ de todos os rifões e dittados de todos os povos. Inredadora, invejosa, má-lingua, sogra emfim, sogra extreme, e puro sangue—como em stylo cigano do Jockey-club, manda a moda anglo-galla que hoje se diga—a sogra excita com dicterios e mentiras a bruteza estupida de seu filho: faz com que elle vá arrancar da cama, e trazer de noite para sua detestavel casa, a infeliz mulher que, sentindo-se com dôres de parto, tinha ido para a de sua mãe buscar o aninho e confôrto que juncto[52] da odiosa sogra não podia achar. Cego de cholera e despeito, o bruto a nada attende. É a morte que lhe dá; bem o sabe, mas pouco lhe importa. A resignação angelica da victima, as suas despedidas ao filhinho recem-nascido, as deixas de seu testamento quando se sente finar nas desabridas alturas ‘d’aquella serra’ por onde a levam n’aquelle cavallo andaluz que ‘anda mais que o luar’—tudo são bellezas de primeira ordem, poesia de coração verdade.
Obtive este romance em Maio de 1843 de uma saloia velha das vizinhanças de Lisboa. Outra licção veio depois, da Beiralta, que não differe muito. Sempre noto porêm alguma variante, pôstoque ellas valham pouco. Parece-me portuguez de nascença; não ha d’elle vestigio em collecção castelhana de que eu saiba.
Este romance é vulgar na Extremadura e Beira e nas duas provincias d’alêm do Tejo. Seguiu-se principalmente o exemplar vindo de Castello-branco, que era o mais amplo; mas approveitou-se de outras licções provinciaes o que foi necessario para lhe dar complemento. Transmittidas de bôcca em bôcca,—não me canso de o repisar—por tantas gerações, éstas coplas foram-se alterando com mutilações e interpolações graduaes, mas não constantes nem uniformes. O rustico menestrel de uma aldea tinha ás vezes pretenção de corrigir e enfeitar a singeleza dos primitivos cantares; outras, a avó velha que os recitava á lareira aos pasmados netinhos, cortava o que lhe parecia demais ou o que lhe[62] esquecia; não poucas vezes, algum Macias namorado recorreu, na esterilidade de sua musa, ao bem parado d’este depósito commum, e, com mudanças de nomes e sitios, transformou a historia de uma antiga aventura em monumento moderno de suas glórias ou desgraças—como das mutiladas reliquias de um templo d’Isis se fazia nas eras byzantinas uma basilica de christãos; como de versos de Virgilio se compunham os celebrados centões; de pensamentos de Homero, de phrases de todos os poetas antigos, cozidos uns nos outros, se urdiam os poemas latinos de ha dois e tres seculos; como ainda até ha bem pouco tempo se escreviam tambem quasi todos os mesmos poemas vulgares. Dem desconto á simplicidade da obra e á inexperiencia do artista, e hão de achar a comparação exacta.
Fazia-se isto porêm desvairadamente em epochas e logares differentes; e d’aqui a necessidade de collacionar as tradições de uma provincia, de um districto, de uma aldea ás vezes, com as de outra.
No romance da ‘Morena’ não parecem descubrir-se[63] vestigios de mui remota antiguidade: assim a adivinhar, deitá-lo-hia pelo seculo dezeseis. A elle sabe o mandar os escravos á fonte buscar agua, o manteo de cochonilha, e outras expressões que taes. Tem comtudo um certo sabor de originalidade no stylo, um tom familiar sem baixeza, um natural tam despido de todo o ornato, que lhe imprimem o cunho verdadeiro e inquestionavel da poesia primitiva de um povo. Quando quer que nascesse ésta flor singella, foi na serra inculta, foi entre o mato virgem das florestas, longe das formalidades da arte, das fataes tesoiras e indigestos adubos do jardineiro.
O assumpto é uma vulgar aventura d’aldea—d’essas que fez tam communs a devassidão dos mosteiros ruraes: isso mesmo a deixou porventura conservar na memoria dos homens como historia do que tinha sido, do que era e sería. Na última copla ha uma pincelada de mestre, dos mestres que faz a natureza, sublime de verdade e profunda de moral: ao incarar com a victima de sua profana leviandade, estendida n’uma tumba, o seductor riu-se,[64] e o marido—diz o sincero trovador—o marido é que chorava!
Não se tomaram aqui liberdades de editor que restaura: é o quadro velho limpo, mas não repintado. Algumas camadas de côr postiça, que tinha porcima, cahiram ao lavar, e ficou mais claro o desenho original. Não foi preciso, como n’outros casos muitas vezes é, cozer a tella rasgada ou avivar o desenho summido: o fundo estava são e inteiro.
Nas collecções castelhanas não ha vestigio d’este romance; tenho-o por inteiramente portuguez e absolutamente popular.
Apezar de que se não incontra nas collecções impressas, sabemos, pelos nossos escriptores portuguezes, que este romance é de inquestionavel origem castelhana. Por fins do seculo XVI ainda se cantava na sociedade, por gentis damas e galantes cavalheiros; e, ja se vê, em castelhano se cantava. D’esse tempo escrevia Jorge Ferreira na AULEGRAPHIA[36]; ‘Não ha entre nós quem perdoe a hũa troua portugueza, que muytas vezes he de vantagem das castelhanas que se tem aforado comnosco e tomado posse do nosso ouvido.’ Bem ás vessas do que succedia dois seculos antes, em tempos do marquez de Santillana,[72] que os castelhanos trovavam em portuguez para serem acceitos seus dizeres e cantares na propria côrte dos reis de Castella[37].
Devia dar-se, ao menos entre nós, a este romance o seu titulo primitivo ‘O rapaz do Conde Daros’, porque assim lhe chama Jorge Ferreira em outra das muito curiosas scenas da ja citada AULEGRAPHIA, tam riccas todas de preciosa e rara informação para o estudo dos costumes e usos d’aquelle tempo. É na primeira do acto III, chistosa e desinfadada conversação entre dois galantes do paço, Dinardo Pereira e Grasidel de Abreu, que se divertem fazendo de l’esprit á moda do tempo com agudezas e requintes, em quanto não vem o jantar ‘que está para dois toques’. Tracta-se entre aquelles fashionaveis da era de quinhentos, de fazer alguma coisa elegante: sonetos, por exemplo, trovas, ou quejandas galanices d’então—como hoje sería jogar um ruber (róber?), experimentar uma walsa nova no piano etc. Não é o menos gracioso[73] d’este quadro, o áparte dos dois criados Rocha e Cardoso, que á soccapa estão glosando e mettendo a ridiculo os alambicados conceitos dos amos. Dinardo, que é o mais prendado, resolve-se emfim pelo romance e a guitarra.
DINARDO
Ora poys que assi te tocarey: O rapaz do Conde Daros.
ROCHA
De prazer vem vosso amo, algum passarinho novo vio lá.
CARDOZO
Vería muyto má ventura, que sempre anda apos estes...
DINARDO, canta
ROCHA
O que elle tem para seu remedio he gentil voz!...
DINARDO, continuando a cantar
(Quebra-se-lhe uma corda) Ah pezar de Mafoma!
CARDOZO
Quebrou-lhe a prima, inda bem!
DINARDO
Vedes este desar tem a musica, quando estais no melhor, leixa-vos em branco uma prima falsa...[38]
Dei mais largas á curiosa citação por ser, como é, tam indubitavel e interessante documento[74] para a historia do romance em Portugal, e porque tambem são ja rarissimos os exemplares d’essa obra de Jorge Ferreira.
Assim andava pois este romance, extrangeiro, e por tal prezado na alta sociedade portugueza; até que, descendo dos salões para o terreiro, a popularidade o naturalizou. Era castelhano no paço, foi-se fazer portuguez na aldea.
Vai em tres seculos que Jorge Ferreira nos deu as últimas novas d’elle quando andava por casas de senhores; achamo-lo hoje á lareira d’algum pobre abegão do Alemtejo,—que para riccos lavradores, com filhas que ja contradançam talvez, senão é que walsam e polkam tambem—é o triste de muito má companhia ja. Tambem das provincias do Norte vieram noticias e cópias d’elle; dos Açores é a mais completa ou a mais extensa que me chegou. Desvairados nomes traz das diversas provincias: aqui é ‘Dona Leonor’ além ‘Dom João’ n’outra parte ‘Dom Carlos’ etc.
Quando ha dez annos o erudito auctor de[75] ISABEL OU A HEROINA DE ARAGÃO[39], o publicou sob o mesmo titulo e como illustração e fundamento do seu poema, era este o quarto romance tradicional que apparecia impresso em portuguez; contando o primeiro no suspeitoso ‘Figueiredo’ de Fr. Bernardo de Brito, o segundo e terceiro na ‘Silvana’ e no ‘Bernal-Francez’ que eu publicára em 1828 em Londres.
Deixo-lhe por titulo, o que trouxe das ilhas, da ‘Donzella que vai á guerra’, porque lhe acho certa graça e simplicidade toda popular, bem propria sempre de taes rhapsodias.
São muitas as variantes, por ser este romance dos mais espalhados pelo reino, e mais favoritos do povo.
Vendido no mercado de Salé pelos corsarios que o tomaram, um pobre captivo christão vai ser escravo de avarento e ricco judeu, que lhe dá negra vida. É o primeiro capítulo de uma historia sabida e commum: e naturalmente se espera ja o segundo, que é namorar-se do interessante captivo a bella filha do mau perro judio, animá-lo, consolá-lo, querer fugir com elle de moirama.—Atéqui vamos pela estrada coimbran d’estas aventuras, que por seculos foram quasi quotidianas entre nós. Mas d’ahi por deante o caso sai um tanto da marcha ordinaria. O captivo não renega nem foge com a bella judia; e ella apaixonada, rendida, perdida... conhece porfim que não é amada: nos molles braços da[86] amante, o ingrato christão suspirava, chorava por sua terra talvez, por outros amores, quem sabe? Mas
Não se espera a vingança da bella judia: da-lhe dinheiro para se resgatar, dinheiro do seu d’ella que sua mãe lhe deixára. Apertada pelo pae que suspeita a verdade, ella confessa tudo, mas defende o christão por innocente; e só de uma alta tôrre, contempla a última vela que lhe foge no horisonte com o ingrato amante.
O romance anda por Lisboa, Ribatejo e Extremadura fóra; não me chegou informação de que se internasse mais pelas provincias: não deve de ser mais antigo que o meado do seculo XVII se a copla em que se allude a Ceuta e a Mazagão não é ‘rifacimento’ moderno, como tambem póde ser, e me inclino a crer que é, porque no resto, o sabor e o stylo é mais velho.
Não apparece nas collecções castelhanas; e se não foi originalmente escripto em portuguez,[87] nacionalizou-se por tal modo, que se lhe não descobre vestigio bem auctorisado e certo de outra origem. Nem façam dúvida os artigos lo, la em vez de o, a; porque não só os escriptores antigos, mas o povo de hoje os substitue assim a miudo quando lh’o pede o mal soante do hyato. Tambem dizem mi’ por minha, padre e madre por pae e mãe; e outros que parecem castelhanismos sem o serem. Me’ pae diz ainda hoje, por euphonia, o alemtejano, como em tempos de Gil-Vicente, se dizia e cantava m’ amor por meu amor.
Não é para admirar que seja tam geralmente sabida e querida ésta xácara. O que admira é que não seja mais commum entre nós o romance maritimo. Um paiz de navegantes, um povo que viveu mais do mar que da terra; que as suas grandes glórias as foi buscar ao largo[97] oceano; que por não caber em seus estreitos limites de Europa, devassou todo o imperio das aguas para se extender pelo universo,—não póde deixar de ter produzido muito Cooper popular e muito Camões de rua e de aldea que, em seus pequenos Lusiadas, cantasse as mil aventuras de tanto galeão e caravella que se lançavam destemidos
Temos em prosa muita relação popular de[98] naufragios que rivaliza em simplicidade antiga com os Chronicons da meia-edade, e cujos escriptores parecem discipulos do arcebispo Turpin, do auctor da ‘Formosa Magallona’ ou da ‘Donzella Theodora.’ Como elles, andaram muitos annos a cavallo em barbantes no logar do cego stacionario, ou no bornal do cego ambulante; e só em meios do seculo passado começaram a junctar-se em volumes na bem conhecida collecção intitulada ‘Historia tragico-maritima[74].’
Algumas d’estas narrativas feitas por pessoas que tiveram parte na aventura, são palpitantes de interêsse e de verdade, contêem descripções inimitaveis, desenhadas do vivo, e taes que fazem impallidecer as mais animadas paginas do ‘Reddrover’ e do ‘Pirata.’
Não cingrariam jamais com os nossos argonautas senão os Homeros das grandes Odysseas? Nunca um pobre menestrel do povo que dissesse na harpa ou na violla esses humildes cantares que não cabem na tuba epica, mas[99] tambem não precisam dos characteres de Gerardo da Vinha ou de Craesbeck, porque se gravam na memoria do povo e se perpetuam no livro vivaz das gerações?
É impossivel: seus poetas tem, seus chronistas, seus historiadores; havia de ter seus menestreis e seus trovadores, a aventurosa vida de nossos mareantes.
Mas essas ingenuas rhapsodias, quem as apagou assim do livro popular? Que estupidos monges fizeram palimpsestes de suas páginas bellas?—que apenas hoje podêmos decyphrar a custo algum fragmento oblitterado como este!
Não é facil responder com precisão. Mas são certas as razões geraes e sabidas do orgulho monachal, e falso gôsto de nossos litteratos de universidade e de côrte. Se tirarmos Gil-Vicente e Bernardim-Ribeiro, o mesmo ou peior diremos dos poetas, que todos ou quasi todos venderam sua alma aos classicos latinos, aos italianos da renascença, e desprezaram, por vulgares, as primitivas fórmas de seus cantores naturaes.
‘A nau Cathrineta’ foi provavelmente o nome popular de algum navio favorito; diminutivo de affeição pôsto na Ribeira-das-naus a algum galeão Sancta Catherina, ou coisa que o valha. Dar-lhe-iam esse appellido coquet por sua airosa mastreação, pelo talhe elegante de seu casco, por alguma d’essas qualidades graciosas que tanto apprecia o ôlho exercitado e fino da gente do mar. Ou talvez é o nome supposto de um navio bem conhecido por outro, que o discreto menestrel quiz occultar por considerações pessoaes e respeitos humanos. Entre as narrativas em prosa que ja citei, ha uma, por titulo—‘Naufrágio que passou Jorge de Albuquerque Coelho, vindo do Brazil no anno de 1565’—que não está muito longe de se parecer com a do romance presente. Larga e difficil viagem, temporaes assombrosos, fome extrema, tentativas de devorarem os mortos, resistencia do commandante a ésta bruteza, milagroso surgir á barra de Lisboa quando menos o esperavam, e quando menos sabiam em que paragens se achassem—tudo isto ha na prosa da narração; e até o poetico[101] episodio de estarem a ver os monumentos e bosques de Cintra sem os reconhecer—como na xácara se viam, pela falsa miragem do demonio, as tres meninas debaixo do laranjal.
Fôsse porêm este, ou fôsse outro o caso que celebra o romance, houve tantos similhantes n’aquelles tempos, que de alguns d’elles, e no fim do seculo XV ou no XVI, se havia de compor. Mais antigo não é. Alêm de outras razões, é hoje averiguado que a poesia primitiva da nossa peninsula rarissima vez admitte o maravilhoso, o Deus ex machina para solução de suas ingenuas peripecias. Composição em que elle appareça, quasi sem hesitar, se deve attribuir a origem franceza, franco-normanda, ou mais seguramente ainda á dos bardos e scaldos que por essas vias se derivasse até nós. Depois é que a mythologia de todas as crenças se confundiu, e ainda a mais extranha é a que mais figurava entre nós.
Tem muitas variantes a ‘nau Cathrineta’; as mais notaveis vão appontadas.
A edição arraiana d’este romance que me veio de Tras-os-montes chama-lhe ‘A filha do imperador de Roma.’ Não a segui no titulo nem em muitas partes do texto, incostei-me antes á licção da Beiralta. E so éstas duas me chegaram; não me consta que n’outras provincias do reino seja conhecido.
Que imperador será este? Teremos aqui algum episodio da crapulosa historia byzantina, ou é outro capitulo licencioso da chronica secreta de Carlos-Magno? O trovador, que a trovou n’essa meia-edade, cujo sêllo visivelmente lhe pende de todas as coplas, não pôs nomes nem datas, segundo o geral costume: e adivinhe quem quizer se este imperador de Roma era do occidente ou do oriente, do alto ou do[110] baixo imperio, Cesar verdadeiro ou Kaiser de imitação germanica? Deve de ser d’estes ultimos pela menção do duque de Lombardia que no fim apparece.
A licção da Beira, que segui mais que a transmontana, tem muitas variantes obscenas que forçosamente deviam ser desprezadas. Nem as creio originaes, senão introduzidas pelo depravado gosto de algum roué d’aldea.
Nos romanceiros castelhanos não se incontra, e para o sul de Portugal é inteiramente desconhecido. Todavia, assim restituida pela collação dos dois textos que obtive, ésta ficou uma das mais completas reliquias da nossa poesia popular que possam incontrar-se.
Veio de Almeida ésta xácara; e de nenhuma outra parte do reino me chegou outra licção d’ella, nem vestigio. Bem antiga me parece. O fronteiro que mandou ao mar a armada do cavalleiro ausente, faz pensar que isto seja coisa do tempo das nossas emprezas de Africa. O logar da scena é inquestionavelmente na raia—e bem pôsto está ao romance o titulo de ‘Noiva arraiana’. Mas aqui ha mar, e armadas que vão ao mar: não póde pois ser outra a raia senão a do Algarve. O stylo da cantiga é ingenuo e purissimo; os costumes que descreve primitivos e patriarchaes; ha um sabor homerico n’este narrar e n’este fallar, que ninguem póde confundir com o dizer estudado de trovadores mais modernos. Poetas de civilisação[120] mais adeantada não sabem ou não podem chegar tanto a rés da natureza.
O facto é simples e mil vezes visto. Outra edição da Lucia de Lamermoor, outro cavalleiro de Ravenswood que apparece de repente no meio da voda de sua debil e mal constante namorada, quando ella, ja desposada com outro, menos esperava tornar a ver o primeiro amante—o seu, o que ella unicamente quer. Quem não lembra de Walter-Scott, e de Donizetti tambem, e do que vibram na alma as palavras de um, as notas do outro, inspiradas por ésta situação altamente dramatica; sublime de angústia e desesperação?
O nosso trovador arraiano tomou as coisas com mais tento e socêgo; não indoudeceu nem mattou a sua Lucia; e nem d’ella nem do seu Ravenswood nos diz que mattassem a mais ninguem. O cavalleiro portuguez faz justiça por outro modo nos que o tinham atraiçoado. Levou-lhes a noiva, e deixou-lhes ficar a voda e o jantar.
Dona Guimar—ou Dona Agueda—de Mexia, como lhe chama a licção do Alemtejo, é um interessante romancinho que apparece na tradição d’aquella provincia e na de Extremadura. Por ambas se apurou o texto que aqui dou.
Nem por outras provincias nossas, nem pelas collecções castelhanas ha outro vestigio d’elle, que eu saiba.
Não é muito antigo o stylo. Mas o facto celebrado é o de uma morte apparente com a qual parece se julgou dissolvido o matrimonio: e d’isto houve exemplos em tempos remotos em que tinham por certa a morte, e por verdadeira resurreição o tornar a si o supposto defuncto.
Seja porêm qual for a data d’esta composição, ha coplas d’ella que vão de par com o mais bello e original da poesia mais primitiva. Notarei especialmente a volta de Dom João á sua terra n’aquella manhan de maio, que os passarinhos cantavam, os sinos tangiam e o rir da natureza se misturava com o chorar dos homens. Tambem não creio que haja nada mais bello que estoutros versos quanto a morta vai tornando a si e pondo olhos no amante:
O último conhecido dos nossos poetas populares antigos, o verdadeiro fundador do theatro d’Hespanha, Gil-Vicente, não era só poeta comico, segundo vulgarmente se crê ás cegas, porque poucos abrem os olhos para o ler com attenção, para estudar n’elle, como todos deviam, lingua, costumes, stylo, côr e tom nacional da epocha: nenhum outro escriptor portuguez os teve tam verdadeiros, tam characterizados e sinceros.
O romance heroico ou epico, isto é, o que celebrava grandes feitos e successos nacionaes, ou interessantes aventuras de guerras e de amores—que d’elle tomaram depois o appellido de romanescas, ou porque não romancescas? hoje mais inglezadamente romanticas—este[138] que tambem rhymou muitas vezes devotas legendas de sanctos e de milagres, os passos da historia sagrada de ambos os Testamentos, e até os proprios mysterios do dogma; o romance epico em toda a sua primitiva simpleza foi tambem cultivado por Gil-Vicente.
Com elle e com Bernardim-Ribeiro creio que morreu, litterariamente fallando, nos fins do seculo XV, principios do XVI, para resuscitar depois, á primeira trombeta do seiscentismo, como todos os generos populares que por essa reacção resurgiram; mas rebicado e contrafeito, secante de metaphoras, pesado de conceitos, escripto emfim com a penna d’aza da ‘Phenix-renascida.’
Quanto elle fôra estimado e cultivado entre nós em tempos de Gil-Vicente, vê-se de muitos logares de seus dramas. E ahi se vê tambem que promiscuamente compunham os nossos trovadores ja no dialecto de Castella, ja no de Portugal, e ainda o mesmo romance ou soláo ora se cantava em uma, ora n’outra linguagem.
Para exemplo e próva, leia-se com attenção[139] o dialogo do feiticeiro com a ama de Cismena na scena II de Rubena[107]. Ahi véem citados como portuguezes e em portuguez, apar de outras cantigas castelhanas, muitos romances que alguns passam hoje por legitimos filhos de Castella e em suas collecções se incontram; de outros nem por ellas ha memorias. Tal é o que começa:
de que não achei outro vestigio nem nos romanceiros castelhanos, nem na nossa tradição oral. Tal é est’outro:
que vem nos citados romanceiros, pôsto que differentemente escripto.
Tambem no auto dos Quatro tempos cantam estes ‘até chegar ao presepio,’ manda a rubrica[108], uma cantiga franceza que diz:
É claro que este é um romance; e romance[140] conhecido, e que não era castelhano nem portuguez, mas francez. E d’aqui se deprehende tambem uma coisa que muitas vezes tenho julgado intrever, e de que tenho quasi uma consciencia íntima, sem ousar dá-la por certa, porque não ha ainda todas as próvas documentaes que se precisam para uma asserção que hade parecer atrevida: e é—que os romances primitivos quasi que eram communs ás linguas romanas, e que nenhuma os vindicava exclusivamente; porque o trovador catalão ou provençal, portuguez, normando ou castelhano pertencia mais á republica litteraria e artistica de sua profissão, do que a nenhum reino ou nação, ou divisão politica do paiz. Cantava-se o romance para lá do Ebro? davam-se ás palavras desinencias mais curtas e contrahidas; dizia-se para cá d’elle? produziam-se mais arredondadas. Entre Portugal e Castella menos era preciso ainda, porque as linguas, ja tam similhantes, ainda o eram mais então, e no especial dialecto do romance dobradamente.
Apponto isto aqui somente como ementa,[141] para mais devagar se reflectir e estudar no que indico. Ha grande verdade na indicação; mas até onde ella chega, não sei dizer porora, nem saberei talvez nunca, porque me não sobra tempo nem paciencia para dar professadamente a estas coisas. Vou escrevendo o que me occorre como curioso. A sciencia fará o seu officio com o tempo. Eu não pretendo a litterato nem a crítico, e n’estas coisas menos que em nenhuma. Occupo as minhas horas vagas com estes divertimentos innocentes; não faço mais nada.
Tornando ao nosso Gil-Vicente, na segunda scena—acto, jornada, ou parte II—da Rubena, canta a Cismena em portuguez outro princípio de romance mui notavel pelo metro pouco usado na nossa lingua:
Muitas outras próvas achará alli o leitor curioso de que este genero era o mais popular então entre nós. Como tal o cultivou Gil-Vicente; e assim o mostra o romance dos Padres[142] no Limbo no auto da ‘Historia de Deus’, o da Barca dos Anjos no auto do ‘Purgatorio’, o da Infanta no auto das ‘Côrtes de Jupiter’, e muitos outros dispersos por suas obras dramaticas, alêm dos dois bem conhecidos que expressamente compôs, um á morte d’elrei Dom Manuel, outro á acclamação de Dom João III.
Este primeiro que aqui ponho é o de Dom Duardos que vem ao fim da tragicomedia (aliás drama cavalheiresco) do mesmo titulo. Em castelhano foi escripta a tragicomedia, e em castelhano alli vem o romance; na collecção, que por vezes tenho citado, do cavalheiro de Oliveira, apparece em portuguez com declaração de se incontrar assim n’um antigo manuscripto do seculo XVI que visivelmente era contemporaneo do poeta. Eu dou-o em ambas as linguas. E pôsto que os nossos vizinhos o codificassem em seus romanceiros como proprio, fica assim evidente o ser elle de fábrica portugueza e do nosso Gil-Vicente, quer primitivamente o composesse elle na nossa lingua, quer na d’elles.
Eisaqui o que, no fim da tragicomedia, diz Artada, antes de cantar o romance:
Acabado de cantar e findo o auto, diz o patrão, virando-se para elrei—não o rei da comedia, mas o rei portuguez Dom João III em cuja côrte e presença ella se representava:
Era pois novo o romance, por seu o dava Gil-Vicente, que não precisava nem usava de brilhar com o alheio, e a elrei seu amo e seu protector, como tal o endereçava. Não posso deixar de o crer e acceitar como seu.
A licção portugueza de Oliveira differe algum tanto da castelhana de Gil-Vicente; e ésta[144] não pouco da que vem no ROMANCEIRO GERAL de Duran e no TESORO de Ochoa.
Juntam-se aqui todas tres, para que as confrontem os curiosos, e se illustre assim a questão que, tórno a dizer, suscito, não resolvo.
Bernardim-Ribeiro foi natural da villa do Torrão no Alemtejo, vivia por fins do XIV, principios do XV seculo; era moço fidalgo d’elrei Dom Manuel e servia no paço, onde a belleza e perfeições da infanta Dona Beatriz lhe[155] inspiraram uma paixão de verdadeiro ‘Macias namorado.’ Ainda não estava tam longe o tempo em que princezas e rainhas ouviam sem infado e acceitavam sem desaire as homenagens dos trovadores. Bernardim era moço, talvez bem parecido, discreto decerto: ha toda a razão de crer que foi ouvido com sympathia[156] e indulgencia. Toda a sua felicidade ficou por aqui, segundo elle diz:
E ésta deve de ser a verdade; ou elle, de fino amante, no’la occultou: em qualquer dos casos devemos crê-lo sôbre sua palavra.
A infanta casou por procuração com o duque Carlos de Saboia, em Lisboa nos paços da Ribeira, a 7 de Abril de 1520[112]; e em Agosto seguinte partiu para Italia. As ‘Saudades’[113] do seu amante ficaram eternizadas no mysterioso livro que com esse titulo compôs. D’elle se extrahiu este romance, propriamente soláo. Tudo aqui é contado e ditto por um modo de enigmas e allegorias inteiramente inexplicaveis para quem ignorasse os mysteriosos amores do trovador e da princeza. Tam sincero—e amiude grosseiro a podêr de sincero—é o modo de dizer dos antigos menestreis, quanto[157] este é delicado por demais, e á força de o ser, obscuro.
O argumento simplissimo diz-se em poucas palavras. Beatriz está retirada em sua camera. Sua paixão por Bernardim é segredo para a boa ama que a criou e que tanto lhe quer. Canta-lhe ésta um ‘cantar’ a modo de ‘soláo’ em que tristemente conta e lamenta a má ventura que desde a nascença tem perseguido a sua querida menina, e que maiores desgraças lhe faz temer no futuro.
O stylo tem toda a ingenuidade dos antigos cantares, todo aquelle perfume de bonina selvagem que só se incontra pelas devezas incultas da poesia primitiva. E todavia, se ainda são as flores singelas do monte, ja se conhece arte no formar do ramalhete. Ja não são as notas desgarradas, e asperas por vezes, do primeiro trovar asturiano ou leonez que tiniam á dureza de ferro dos descendentes de Pelayo. Ja por aqui andam modos de trovador proençal. A melodia porêm ainda é puramente romantica; as harmonias é que presentem fórmas mais classicas. Vê-se o antigo toante do[158] romance peninsular cedendo á difficil e dura lei das complicadas rhymas proençaes. Ha mais ainda; ha uma perfeição no número dos rhytmos que adivinha ja as doçuras italianas. É o trovador do seculo XV dando a mão ao poeta do seculo XVI. O que predomina todavia é o modo provençal; e este é, repitto, um legitimo soláo.
Este, que é verdadeiro romance na fórma assim como no stylo, parece ter sido feito á partida da infanta para Saboia, ou talvez por occasião da viagem que Bernardim-Ribeiro alli fez para a ver.
Fôsse como ou quando fôsse, elle é admiravel. Ha menos artificio metrico, não menos belleza de poesia que nos outros, não menos sentimento. O stylo é mais desleixado, mais vago, mais de romance.
Em todas as vastissimas collecções castelhanas não ha nada tam bello de elegante simplicidade. Ja se vê que não faço a comparação no genero heroico ou historico; digo-o dos romances de amor e aventura.
Todo este soláo—e creio que propriamente este é tambem um verdadeiro soláo—todo elle é alegorico dos mysteriosos amores do ‘poeta das saudades.’
Bernardim-Ribeiro vaga triste e solitario pelas margens de um rio escuro e cuberto de arvoredo. Apparece-lhe o seu Cuidado na figura de um velho incannecido que lhe mostra o seu fatal Desejo todo cuberto de dó; chorando e pensativo declara-lhe que em má hora o viu porque nunca mais o hade esquecer. Some-se a visão; e elle caminha rio abaixo, até dar ‘antre uns medonhos penedos’ (se será Cintra?) onde a Phantasia lhe apresenta sua triste Lembrança na figura de uma bella mulher de ‘loiros cabellos e olhos verdes,’[174] cuberta de um negro manto. É Beatriz que elle ama, que o adora e que não póde ser sua! Escura noite lhe esconde a visão bemaventurada; e de um ‘alto oiteiro’ lhe bradam (porque não dos Alpes, do Piemonte onde lh’a tinham levado?)—‘Bernardim-Ribeiro, olha onde estás.’
Da demasiada altura onde subiram, seus atrevidos pensamentos lhe fazem recordar quam baixo o tinha pôsto a sorte para se atrever a tanto.—O namorado trovador cerra os olhos para nunca mais os abrir. Que lhe resta a elle que ver o mundo?
Este romance seria feito ao ordenar-se o casamento da infanta com o duque de Saboia? Não vem inserto nas SAUDADES, como o antecedente, da Ama, e o subsequente de Avalor: por isso aqui pôs claro o seu nome de Bernardim-Ribeiro, que no mysterioso livro de cavallarias, ora se disfarça em anagrammas de suas proprias lettras, ora sob as de outros se desfigura, para confundir e inredar a todo o que não tivesse a chave do querido segredo. O nome porêm da infanta nem aqui, nem em[175] parte nenhuma o expôs a ser deciphrado pela mais remota inducção. N’este romance não ha nomes femininos; os que se incontram em tudo quanto escreveu, assim podem ser Maria, Antonia, como Joanna, etc. Em nenhum ha lettras ou sons que se pareçam com os de Beatriz.
Nada digo do stylo, é o mesmo da peça precedente. As bellezas são infinitas; nenhum poeta portuguez escreveu tanto com o sangue de seu coração.
Não parece ésta uma d’aquellas verdes anecdotas que a prosa de Bocacio e os versos de Lafontaine immortalizaram? O stylo é menos licencioso, porque, sincera e nua ás vezes, comtudo é sempre mais casta a poesia primitiva. O seu pudor é o da ingenuidade que se despe porque mal não pensa, não o da hypocrisia que por maliciosa se cobre. Comtudo os dois ultimos versos são um verdadeiro remate de epigramma que faria honra a um poeta da eschola de Voltaire, e podia ser feixo de uma cantiga de vaudeville de Scribe. Entre portuguezes, só D. Francisco Manuel de Mello ou Nicolau Tolentino os faria tam naturaes e tam picantes ao mesmo tempo.
Assim a adivinhar, que é o unico modo de[186] entrar n’estes pontos, orço a data d’esta composição pelos tempos da guerra da acclamação, isto é, por meados do seculo XVII.
É ommisso nos romanceiros dos nossos vizinhos; e em Portugal não tenho noticia de que se incontre senão na tradição oral de Tras-os-Montes, onde achei tres cópias d’elle, uma mais completa que as outras: d’ellas se appurou o presente texto. As variantes quasi todas despreziveis.
Ha duas balladas escriptas em dialecto escocez por elrei James V de Escocia, que ambas se parecem muito com ésta. Uma especialmente, ‘The Gaberlunzie man,’ até no metro e nas fórmas exteriores dá bastantes ares da nossa xácara. Começa assim:
O rei James, que morreu de trinta e tres annos, em 13 de Dezembro de 1542, era um joven rei, tunante e maganão, que se disfarçava em trajos de mendigo, de adello, ou que[194] taes, para andar correndo baixas aventuras pelas aldeas ou pelos bairros escusos das cidades. Cantor de seus proprios feitos, celebrava-os depois em gallantes trovas, a que não falta a graça nem o chiste do genero. A que se intitula The Jolly Beggar, e que por licenciosa e fresca de mais, a não admittiu o bispo Percy na sua collecção, talvez tenha ainda mais merito de arte.
O Gaberlunzie man da real ballada é porêm todo inteiro o Cego da nossa xácara, menos em certos incidentes que são mais poeticos e mais interessantes na composição portugueza.
Disfarçado em trajos de cego mendigo, um senhor de alta jerarchia fallou de amores a uma donzella de muito inferior nascimento que vivia com sua velha mãe. Por accôrdo, mais ou menos expresso entre os dois amantes, se appresenta este por noite á porta da velha com sua caramunha. A mãe dorme; e Anninhas, que responde ao cego, parece fazê-lo ou com ironia ou em pique de ciumes, e por nenhum modo lhe quer abrir ‘porta ou postigo.’
Põe-se o cego a cantar lamentosamente a soa desgraça; e com a chorada cantilena se abranda ou finge abrandar-se o coração da rapariga. Desperta a mãe para que o venha ouvir; e quando ésta condoida lhe manda dar esmola, o cego recusa, não quer senão que o ponham no caminho que perdeu. É a propria velha, coitada, a que diz á filha que lh’o va insinar. E assim fogem os dois, com a maior tranquilidade com que ainda fugiram amantes.
Note porêm a maestria do nosso poeta popular. A fugitiva sustenta sempre aquella tam perdoavel hypocrisia feminina, último protesto do pudor moribundo. Fiando homericamente na sua roca, vai fingindo guiar o cego, vai parecendo acreditar que não sabe aonde nem a que vai. Senão quando, apparece um tropel de cavalleiros: é a comitiva do nosso rei incuberto, principe ou conde pelo menos. Adeus gaivão de cego, e andrajos de mendigo! A cavallo e trotar largo! Ja o cego vê, ja a donzella sabe onde vai. E com este seu fino e malicioso ditto, conclue a trova:
Tal é o argumento da cantiga portugueza muito mais romanesco do que o das escocezas, pôsto que seja o mesmo o fundo da anecdota.
Não duvido suppor que talvez de Glasgow ou de Aberdeen trouxessem os nossos mareantes ésta historia, e de Vianna ou do Porto se internasse pelo Minho onde ella é mais vulgar. Não lh’o pagariamos so em vinho e frutta aos nossos amigos do norte, porque em mercadorias d’aquelle mesmo genero para lá temos exportado bastante.
A forma métrica é a do romance de Sancta Iria. O texto foi restituido com difficuldade, porque ésta fórma se presta ainda mais á corrupção do que a outra, desafiando o prolifico talento dos nossos trovadores de aldea a bordar seus pretenciosos floripondios sôbre a singela telagarsa do original.
Vão por ementa, appontadas algumas variantes menos absurdas.
Quem desce Tejo abaixo, por ésta margem do Norte onde está Lisboa, e tendo saudado o precioso monumento de Belem, a sua tôrre não menos bella, entra no fashionavel Pedroiços e d’ahi segue ás praias do Dafundo até á Cruz-quebrada, tem dado o mais bonito passeio que se póde dar nas vizinhanças da capital, e visitado os sitios que, depois de Cintra, mais frequenta a sociedade elegante da nossa terra. De fins de Agosto a principios de Novembro é que tudo alli corre, e que os banhos do mar povoam aquelles bellos ermos, nas outras estações desamparados.
Quem tiver porêm o bom gôsto de resistir ao despotismo tarifeiro da moda, e se abalançar em Maio ou Junho a este largo passeio,[202] que no estado dos nossos caminhos é antes uma pequena viagem, creia que hade ser pago de sua nobre ousadia. Não ha palavras que digam todas as bellezas d’aquella terra, d’aquelle ceo, d’aquellas aguas. Á esquerda o Tejo, os navios que entram e sahem, as frotas de barcos pescarejos, a areia alva juncto á beira d’agua, e logo pegada á salsugem, a prodigiosa vegetação das plantas que a amam e em que se pasce gulloso e largo á vontade o gado. Perto, um saveiro que chegou á terra e cuja companha pucha ao longo da praia pela rede que arrasta os innumeraveis cardumes de peixes que logo virão saltar na areia. Á direita nas eminencias, as ruinas picturescas de conventos desertos, de moinhos abandonados, de fortes, de atalaias. E tudo isto incastoado na verdura viçosa e florida da primavera que ainda não queimou o sol do estio. No fim do verão quando vai todo o mundo, ja não ha senão resteva nos campos, talos de hervas seccas nos montes, árvores sem folha, poeira nos ares, e uma ventaneira despregada que não cessa.
Ja me eram familiares de annos aquelles sitios; mas posso dizer que os não conheci bem e como elles são devéras, senão quando, haverá hoje tres annos, alli fui um dia primeiro de Maio. Fui, como de maravilha em maravilha, por todos os pontos que tenho nomeado; mas chegando á ribeira de Jamor, parei extasiado no meio de sua ponte, porque a varzea que d’ahi se extende, recurvando-se pela direita para Carnaxide, e os montes que a abrigam em deredor, estava tudo de uma belleza que verdadeiramente fascinava. O trigo verde e viçoso ondeava com a viração desde as veigas que rega o Jamor, até os altos onde velejam centenares de moinhos. Árvores grandes e bellas, como rara vez se incontram n’esta provincia dendroclasta, rodeavam melancholicamente, no mais fundo do vale, a velha mansão do Rodizio. E lá, em prespectiva, no fundo do quadro, uma aldea de Suissa com suas casinhas brancas, suas ruas em soccalcos, seu presbiterio ornado de um ramalhete de faias; grandes massas de basalto negro pelo meio de tudo isto, parreiraes, jardinzitos quasi pensis,[204] e uma graça, uma simplicidade alpina, um sabor de campo, um cheiro de montanha, como é difficil de incontrar tam perto de uma grande capital.
O logarejo é bem conhecido de nome e fama, chama-se Linda-a-Pastora. Porque? Não sei. Tem-me jurado antiquarios de ‘meia-tijella’ que o seu nome verdadeiro é Niña a Pastora. Mas emquanto não achar algum de ‘tijella inteira’ que me saiba dar a razão por que se havia de chamar assim, meio em portuguez meio em castelhano, um aldeote de aopé de Lisboa—heide chamar-lhe eu, como os seus habitantes e toda a gente diz: Linda-a-Pastora.
Namorei-me do sitio por modo, que alli passei o verão todo; e d’alli fiz deliciosas excursões pelas vizinhanças, que todas são bonitas. Foi n’este proprio e appropriado sitio que a Sr.ª Francisca, lavadeira bem conhecida do logar, me deu a última e, ao parecer, mais correcta licção que do presente romance tinha obtido. Em outras partes do reino traz elle o titulo de ‘Pastorinha;’ aqui era justo e natural[205] que se lhe désse o de Linda-a-Pastora’, que assentei conservar-lhe.
Na fórma é um romance em endeixas, mas o fundo é de uma verdadeira pastourella do genero provençal; nem a fariam mais graciosa Giraud Riquier ou Giraud de Borneill.
Tem muitas variantes, porque todo o reino a sabe e canta. Eu noto somente as principaes.
Ei-lo que se apea de seu classico barbante em que tantos annos cavalgou, e despindo o papel-pardo em que o imbrulhavam os cegos e vendilhões de nossas feiras, vem o nobre ‘Marquez de Mantua’ tomar o seu logar entre os mais venerandos e antigos romances do cyclo[213] de Carlos-Magno. Sua nobre origem bem sabida é e bem manifesta: franceza ou provençal. Se foi a lingua d’oeil ou a lingua d’oc a primeira que fallou, não sei; quando atravessou os Pyreneus e veio para nós, certo que era ja familiar com ambas. Passou muito tempo em Hespanha por ser composição de Jeronymo Treviño[139]; hoje com razão se crê que o Treviño[214] não foi senão o editor que em 1598 o imprimiu: sem dúvida o romance é muito mais antigo que isso; so da licção portugueza me parece que posso responder que é dos fins do XIV, principios—quando muito—do XV seculo. E todavia a fórma em que elle apparece em portuguez não creio que fosse a primitiva que entre nós teve, e me inclino a que ella seja posterior á que teem os nossos vizinhos castelhanos em suas collecções[140]. Aqui é mais dramatico, lá mais épico: nas multiplicadas edições dos cegos chegou a obter o nome de tragedia. Todavia, não deixarei de observar que revestidos d’esta mesma fórma ha romances muito mais antigos do que os narrativos. As rúbricas de aqui falla o marquez, agora diz o imperador etc., não são indisputavel próva de que a composição fôsse para se representar theatralmente.
Sem profundar nenhuma d’estas questões, contento-me de sacar do lixo da “feira-da-ladra”,[215] ésta bella reliquia da nossa litteratura popular e romanesca, e de restituir ao seu eminente logar o nobre marquez de Mantua, embora me criminem e escarneçam os superciliosos academicos de todas as academias reaes e não reaes d’este mundo.
Como natural appendice e illustração aos dois precedentes livros, transcreverei aqui a traducção ingleza de alguns romances do primeiro, que o meu amigo Sir John Adamson publicou no segundo volume da sua LUSITANIA ILLUSTRATA[141].
E approveito ésta occasião para agradecer publicamente ao illustre biographo de Camões a distincta honra que me fez associando o meu humilde nome ao do mais célebre homem d’estado de Portugal, o lamentado Duque de Palmella, quando nos dedicou os dois primeiros volumes d’aquella sua estimada collecção.
A versão ingleza tem o raro merecimento de ser em extremo fiel e quasi litteral, sacrificando muitas vezes a propria elegancia da linguagem á exacção do pensamento e até da propria phrase.
Em continuação do appendice, aqui juncto egualmente, para illustração do romance IX d’este livro que leva por titulo REGINALDO[142], as duas licções castelhanas que d’elle apparecem agora na última recente edição do ROMANCERO de Duran.
Na introducção áquelle romance disse eu que elle não apparecia nas collecções castelhanas, porque em nenhuma das anteriores a ésta de 1849-51 o tinha podido incontrar.
Essa parte do texto, assim como a nota correspondente[143] precisam pois d’esta correcção.
[7] Mais outro exemplo do que era frequente nos antigos cantares repetirem, de uns para outros, certos dizeres que cahiam em graça. Veja no ‘Reginaldo’ pag. 175, tom. II do ROMANCEIRO.
[11] Veja o que, a este respeito e sôbre a repetição d’esta linda imagem, deixo escripto na ‘Rosalinda’, pag. 163-168, tomo I do ROMANCEIRO.
[14] Romanceiro, I, pag. 181, ed. de 1843.
Ésta licção do Minho dá por titulo ao romance ‘A Princeza’.
Noto ésta variante para marcar o uso indistincto das palavras ‘pinhal e pinheiral’ que a lingua consente.
A licção que segui no texto é a que veio do Porto, que Minho é; mas não a acho melhor do que qualquer das outras. Segui-a porque, no todo do romance, é a mais completa.
[27] Oiro em stylo camponez quer dizer—joias, ornatos de oiro de pessoa. O meu oiro é o oiro com que me adorno—como em stylo de cidade a minha prata é a prata de meu serviço de casa.
[31] Em algumas licções provinciaes, designadamente nas da Extremadura, começa assim:
[36] Aulegraphia, act. II, sc. 9, fol. 66. vers. da ed. de 1619.
[37] Carta do marquez de Santillana ao condestavel de Portugal: pag. LVII, tom. I da collecção de Sanches, Madrid 1779.
[38] Aulegraphia, act. III, sc. I, fol. 84.
[39] Isabel ou a heroina de aragão por J. M. da Costa e Silva. Lisboa, 1832.
[53] As mesmas variantes respectivas.
[57] As mesmas variantes.
[63] Ni blanca é claramente castelhano dizer; mas nos mais puros nossos escriptores se incontra. Ditto familiar que se introduziu então, como hoje dizemos tanta palavra e phrase franceza ou ingleza, por termos com as coisas, livros e usos d’estas nações o mesmo tracto que então tinhamos com castelhanos.
[67] Este é um dos muitos exemplos de se faltar de vez em quando á forçada lei da redondilha, augmentando-a com dois versos no mesmo repisado consoante ou toante obrigado.
Ésta phrase a soldado para dizer: estão servindo a soldada, a soldo, como criados, etc. foi nova para mim; vê-se porém que é legitima portugueza. Não approveitei para o texto ésta variante por causa da amphibologia.
[70] Outro exemplo de accrescentar dois versos á redondilha, mas sem repetir o consoante senão em um d’elles.
[74] Historia tragico-maritima, em que se escrevem, etc. Por Bernardo Gomes de Brito. Lisboa occidental, 1735.
[77] Todas as licções dizem assim, menos a do Algarve que adoptei.
[84] A licção de Lisboa acaba aqui o romance por differente modo. Deixando o sobrenatural da tentação do demonio que toma a fórma de gageiro para tentar o capitão n’aquelle perigo, dá por verdadeira a apparição da terra, e conclue assim:
Outra licção tambem diz n’esta última copla:
N’esta licção de Tras-os-Montes que dá a Sr.ª Maria Joaquina do logar de Nantes, a xácara acaba com a variante citada.
[107] Gil-vicente, edição de Hamburgo 1834, tom. II, pag. 27.
[108] Ibid. tom. I, pag. 92.
[109] Licção portugueza segundo OLIVEIRA.
[110] Obras de GIL-VICENTE, ed. de Hamburgo 1834. Tom. II, p. 249.
[111] Romancero general, Part. I.
[112] Garcia de Rezende, HIDA DA INFANTA, etc.
[113] Saudades de bernardim-ribeiro. Lisboa 1785.
[114] No sentido de dar o penço á criança; com a qual significação o verbo se deve escrever com ç e não com s.
[115] Nascida.
[116] Tem para si.
[117] De nenhuma coisa duvido, que seja azo de damnos.
[118] Que, pois que.
[119] Trás a, após a.
[120] Defronte d’elle.
[121] Incannecido, de cabello branco.
[122] Sou.
[123] Pazes.
[126] Percy’s RELIQUES OF ANCIENT ENGLISH POETRY, Series II, book I, 10.
[129] Diminutivo minhoto de Anna.
[130] Este é um modo de dizer provinciano bastante usado do nosso povo em quasi todo o reino. ‘Filho, lo meu filho; madre, la mi’ madre etc.’ occorre em muitas cantigas populares, romances e similhantes. São reliquias do antigo asturiano que o nosso dialecto conservou tanto e mais do que o castelhano. O mesmo fizeram os nossos vizinhos de Galliza. Tem sido tenaz n’estes bellos archaismos a poesia do povo, porque a salva dos hyatos que tanto lhe repugnam.
[139] Pelicer, notas a DOM QUIXOTE.
[140] Cancioneiro de romances; SILVA DE VARIOS ROMANCES; FLORESTA DE VARIOS; e ultimamente Duran, ROMANCERO GENERAL, ed. de 1849-51, tom. I, pag. 207.
[141] Lusitania illustrata, Part the second. Newcastle-upon-Tyne, 1846.
[142] Livro II, parte I, romance IX, tom. II, pag. 167.
[143] Nota G, pag. 312 do tom. II.
[144] Romancero general, 1849-51, tom. I, pag. 175. Ésta é a licção mais antiga, foi achada em um pliego suelto, folha volante, impresso.
[145] Romancero general, 1849-51, tom. I, pag. 176.
[146] Marquez de Mantua, folheto de cegos, Lisboa 1789.
O rigor do toante pedia aqui que se escrevesse chegare com e no fim, como pronuncia o povo de Lisboa e n’outras partes da Extremadura. Os antigos castelhanos tambem assim regularizavam os seus toantes.
E não va tampouco sem notar-se que assim fica demonstrado não ser affectação de latinismo o escrever e pronunciar pae em vez de pai, mãe em vez de mãi. Aquella é a verdadeira e popular orthographia d’estas palavras.
O principio ou introducção d’este romance é conforme a collecção de Oliveira. No folheto dos cegos começa elle logo com toda a fórma scenica; e todavia differe bem pouco. Aqui se transcreve.
FIM DO VOLUME TERCEIRO
Pag. | ||
Advertencia da primeira edição | V | |
Romanceiro, livro II, parte II | 7 | |
XVII | A Romeira | 7 |
XVIII | Conde Nillo | 15 |
XIX | Albaninha | 23 |
XX | A Peregrina | 31 |
XXI | Dom João | 39 |
XXII | Helena | 49 |
XXIII | A Morena | 59 |
XXIV | Donzella que vai á guerra | 69 |
XXV | O Captivo | 83 |
XXVI | A Nau Cathrineta | 95 |
XXVII | O Cegador | 107 |
XXVIII | A Noiva arraiana | 117 |
XXIX | Guimar | 125 |
XXX | Dom Duardos | 135 |
XXXI | A Ama | 153 |
XXXII | Avalor | 163 |
XXXIII | Cuidado e Desejo | 171 |
XXXIV | O Cordão de oiro | 183 |
XXXV | O Cego | 191 |
XXXVI | Linda-a-Pastora | 199 |
XXXVII | O Marquez de Mantua | 211 |
Appendice | 271 | |
Notas | 305 |
End of the Project Gutenberg EBook of Romanceiro III, by V. de Almeida Garrett *** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK ROMANCEIRO III *** ***** This file should be named 63439-h.htm or 63439-h.zip ***** This and all associated files of various formats will be found in: http://www.gutenberg.org/6/3/4/3/63439/ Produced by Pedro Saborano and the Online Distributed Proofreading Team at https://www.pgdp.net (This book was produced from scanned images of public domain material from the Google Books project.) Updated editions will replace the previous one--the old editions will be renamed. Creating the works from public domain print editions means that no one owns a United States copyright in these works, so the Foundation (and you!) can copy and distribute it in the United States without permission and without paying copyright royalties. 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It exists because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from people in all walks of life. Volunteers and financial support to provide volunteers with the assistance they need, are critical to reaching Project Gutenberg-tm's goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will remain freely available for generations to come. In 2001, the Project Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations. To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4 and the Foundation web page at http://www.pglaf.org. Section 3. Information about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit 501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal Revenue Service. The Foundation's EIN or federal tax identification number is 64-6221541. Its 501(c)(3) letter is posted at http://pglaf.org/fundraising. Contributions to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent permitted by U.S. federal laws and your state's laws. The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S. Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered throughout numerous locations. Its business office is located at 809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email business@pglaf.org. Email contact links and up to date contact information can be found at the Foundation's web site and official page at http://pglaf.org For additional contact information: Dr. Gregory B. Newby Chief Executive and Director gbnewby@pglaf.org Section 4. Information about Donations to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide spread public support and donations to carry out its mission of increasing the number of public domain and licensed works that can be freely distributed in machine readable form accessible by the widest array of equipment including outdated equipment. Many small donations ($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt status with the IRS. The Foundation is committed to complying with the laws regulating charities and charitable donations in all 50 states of the United States. Compliance requirements are not uniform and it takes a considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up with these requirements. We do not solicit donations in locations where we have not received written confirmation of compliance. To SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any particular state visit http://pglaf.org While we cannot and do not solicit contributions from states where we have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition against accepting unsolicited donations from donors in such states who approach us with offers to donate. International donations are gratefully accepted, but we cannot make any statements concerning tax treatment of donations received from outside the United States. U.S. laws alone swamp our small staff. Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation methods and addresses. Donations are accepted in a number of other ways including checks, online payments and credit card donations. To donate, please visit: http://pglaf.org/donate Section 5. General Information About Project Gutenberg-tm electronic works. Professor Michael S. Hart is the originator of the Project Gutenberg-tm concept of a library of electronic works that could be freely shared with anyone. For thirty years, he produced and distributed Project Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support. Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S. unless a copyright notice is included. Thus, we do not necessarily keep eBooks in compliance with any particular paper edition. Most people start at our Web site which has the main PG search facility: http://www.gutenberg.org This Web site includes information about Project Gutenberg-tm, including how to make donations to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to subscribe to our email newsletter to hear about new eBooks.